Ruy Cabeção diz que treinador foi o motivo de sua saída do Grêmio/ Foto: Lairto Martins |
Ruy Bueno Neto começou a carreira no América/MG. Ganhou fama
nacionalmente após se destacar com a camisa 2 do Botafogo, onde se
tornou ídolo. Após passagens por grandes clubes brasileiros, acaba de
disputar a Série C pelo Brasiliense-DF. Aos 34 anos, o experiente
jogador revela bastidores da relação entre jogador e empresário e o
desejo de ser treinador futuramente. Abaixo, você confere a entrevista
exclusiva que o Cabeção deu para o blog do Caio Fiusa.
Caio Fiusa: Hoje, você tem contrato com alguém? Surgiu alguma proposta ou sondagem?
Ruy Cabeção: Estou sem clube. Sondagem tem, mas proposta concreta ainda não.
CF: Está esperando o ano terminar para decidir?
RC: Não.
Estou esperando uma coisa bacana. A gente tem que analisar tudo, o
time, o campeonato que vai ser disputado. Não estou trabalhando mais com
escritório, não tenho nada assinado com nenhum empresário mais. Então, é
direto comigo mesmo.
CF: Você passou por
grandes clubes como Cruzeiro, Botafogo, Fluminense e Grêmio. Mas foi no
Botafogo que você conseguiu destaque nacional. Foi a sua melhor
passagem?
RC: Foi, porque a identificação com a
torcida era e é muito grande. Mas, tiveram outros clubes em que eu tive
momentos bons também. No próprio Cruzeiro, eu tive muitos, mas por ser
mineiro, ser prata da casa do estado, o reconhecimento às vezes não é o
mesmo. O Grêmio também, fiquei pouco tempo, mas fui eleito melhor
lateral do campeonato gaúcho. Não tem um time específico. O carinho
maior que eu carrego até hoje é da torcida do Botafogo.
CF:
Você é lembrado pelo jogo da final do Carioca de 2006, no qual mesmo
machucado, permanceu em campo. Foi o momento ou o jogo mais marcante da
sua carreira?
RC: Tive muitos. Eu sou um
jogador que tenho um reconhecimento maior do torcedor. Em Minas Gerais,
algumas pessoas vinculadas à imprensa - eram minoria, mas de meios
importantes - infelizmente tinham problemas pessoais comigo. outros não
reconheciam, prefiriam falar mal. No Cruzeiro, eu fiquei
marcado por ter participado da jogada do gol de despedida do Sorín. No
título mineiro do América/MG, eu que fiz a jogada toda sozinho para o
gol do Alessandro. No Botafogo teve esse jogo. No Figueirense, quase
fomos campeões da Copa do Brasil. E no Grêmio, a gente chegou a uma
semi-final de Libertadores e foi a minha primeira. Cada time tem um
momento.
CF: A sua passagem pelo Fluminense interferiu na relação com a torcida alvinegra?
RC: Não, de forma alguma.
CF: Foi bem recebido nas Laranjeiras?
RC: Sim. Tenho o respeito do torcedor por ter feito parte do grupo de 2009, que se livrou do rebaixamento.
CF: No início você era só Ruy, depois adotou o Cabeção. Alguma vez o apelido incomodou?
RC: Não.
Esse apelido começou com a torcida do Cruzeiro, mas foi se firmar mesmo
no Botafogo. Eu carrego desde criança, o pessoal da minha rua, do meu
bairro, sempre me chamaram de Cabeção. Então, nunca incomodou não.
CF: Você falou do Grêmio, onde começou muito bem, marcando dois gols nos dois primeiros jogos. Depois saiu no meio do ano. Porquê?
RC: Eu
saí exclusivamente por culpa do treinador. Eu tive um desentendimento
com ele na semi-final da Libertadores. Eu iria ficar treinando em
separado, mas o Celso Barros (presidente da patrocinadora do Fluminense)
me ligou pedindo para ajudar o time e me ofereceu dois anos de
contrato. Foi por isso que eu saí, se não, teria continuado lá. A
diretoria, os jogadores e a torcida gostavam de mim.
CF: Se arrepende de ter saído do Grêmio naquela época?
RC: Não
é questão de se arrepender ou não. Eu gostava muito de jogar pelo
Grêmio. Na minha estreia eu fiz um gol, fui muito bem no Estadual, era
titular absoluto, tinha muita coisa boa que poderia acontecer.
Infelizmente, apareceu mais um treinador para atrapalhar minha carreira,
mas é vida que segue e serve de aprendizado.
CF: Você ficou conhecido por jogar na lateral. Depois, passou a atuar como meia. Como foi essa transição?
RC: Nos
últimos quatro ou cinco anos, eu venho jogando mais como segundo
volante ou meia direita. Mas, querendo ou não, sempre um treinador me
pede para atuar na lateral. Isso vai mais por questão do elenco. Para
mim, jogar no meio de campo, não foi nenhuma novidade. A minha categoria
de base foi toda feita como meia direita. Quem me colocou como lateral
direito foi o Vanderlei Luxemburgo, na época em que estava em falta no
Brasil. Ele achava que eu poderia ser feliz ali. E realmente fui.
CF: Você falou que passou a jogar de lateral por causa de uma opção do Luxemburgo. A posição de lateral ainda é carente?
RC: Hoje,
não. Logo após a época do Cafu, não tínhamos laterais-direito no
Brasil. Agora, a gente tem o Daniel Alves, o Maicon, que apesar da idade é
um dos melhores na posição, e alguns meninos bons que estão aparecendo.
CF: Quais as principais diferenças entre atuar na lateral e no meio?
RC: Infelizmente,
o lateral é muito dependente do meio de campo. Se ele não tiver
volantes e meias que balancem o jogo, de um lado para o outro, vai
morrer de fome. Já, o meia não, é o coração do time, do futebol mundial.
A bola está sempre passando por ali. Você tem condição de participar
mais da partida com a bola no pé.
CF: Acha que ainda tem vaga para você em algum clube da primeira divisão?
RC: Sinceramente,
para jogar em um clube de ponta está complicado. O futebol está
monopolizado. Existem alguns empresários no futebol brasileiro que para o
jogador entrar em um time grande, tem que passar por eles. E o exemplo
serve para mim. Quando deixei de trabalhar com meu empresário, que tinha
se vinculado a um outro, grande no meio do futebol, a dificuldade de
arranjar espaço na Série A ficou maior. Ele passou a não querer
trabalhar comigo por conta da minha idade e por não trazer nenhum
retorno a eles. Voce vê jogadores tecnicamente de niveis inferiores, mas
que podem dar um retorno para os times e empresários, que tem vaga
garantida (nos clubes) e ficam pulando de um para o outro, até atingir
30 anos. Jogador acima dessa idade não vale nada.
CF: Por já ter 34, você já pensa em parar? Alguma ideia do que pretende fazer quando se aposentar?
RC: Por
enquanto, não. No próprio Brasiliense, os preparadores físicos e os
treinadores que passaram por lá, me disseram que posso jogar
tranquilamente até aos 40. Mas, pelas minhas contas, pretendo atuar por
mais 3 anos para poder treinar todos os dias e acompanhar o ritmo de
todo mundo. Quando me aposentar, eu tenho muita vontade de ser técnico
um dia.
CF: Pretende encerrar a carreira em algum clube específico? No Botafogo, América/MG, Grêmio...
RC: Isso
eu não penso. No Botafogo, é lógico que eu tive meu momento de ídolo,
mas eu não posso nunca me comparar a um Túlio Maravilha, a um Sérgio
Manoel, Wágner, Gottardo, Gonçalves. O clube estava a quase dez anos sem
ganhar o Carioca e eu joguei machucado, o certo seria não jogar, tanto
que fiquei 52 dias parado depois. Isso marcou muito a torcida. Mas eu
tenho humildade e sei da grandeza que eles têm e não posso me comparar.
Quero parar em um time bacana, sem jogo de despedida.
CF: Você nunca foi ligado à polêmicas, que rondam o mundo dos jogadores de futebol. Como é a sua vida fora dos campos?
RC: Uma
coisa que existe é a hipocrisia. Tem muito jogador que se diz
evangélico, mas não sai da noite e enche a cara. Eu fico no meio termo.
Apesar de ser casado e ter duas filhas, nunca deixei de sair e tomar a
minha cerveja na hora certa. Aqui no Brasil, a coisa mais estranha do
mundo é jogador beber e fumar. Você vai na Europa e os jogadores bebem e
fumam muito mais do que os daqui. Lá, existe o profissionalismo, eles
não se preocupam com a vida pessoal do jogador, só querem que ele renda
dentro de campo. Eu faço tudo que uma pessoa ''normal'' faz, lógico que
tenho as minhas restrições. Sou muito feliz porque sempre soube
aproveitar a minha vida da melhor maneira possível.
CF: Você
afirmou em uma entrevista que os técnicos Celso Roth, Mario Sérgio e
Levir Culpi foram importantes por serem diretos e sem frescuras. Tem
muita frescura no futebol?
RC: Futebol hoje
virou um mega evento. Os clubes aprenderam a usar o marketing. Os
jogadores importantes conseguem ficar aqui muito tempo. Então, está
envolvendo muita coisa. Existem empresários no meio que tem jogadores,
são donos de clubes, muita influência e são só os caras (agenciados)
deles que entram nos times. Os empresários não estão preocupados com os
clubes. Só querem mostrar o produto deles. Nesse sentido, o futebol está
chato.
CF: O Grêmio prepara o seu adeus ao
estádio Olímpico. Um assunto, relacionado a isso, que vem sendo muito
debatido, na internet especialmente, é o fim da ''avalanche''. O que
você pensa a respeito?
RC: Isso é complicado
dizer. É uma característica muito forte e tradicional da Geral. A gente
fica triste, mas o futebol tem que ter um crescimento. Reclamamos há
muitos anos que o Brasil tem que ter estádios modernos e agora estamos
seguindo essa linha. Se tivesse alguma outra forma, um consenso, criar
um cantinho só para essa organizada, não sei, é difícil. A repercussão
vai ser muito grande por ser uma marca registrada gremista.
CF: Falando
sobre o seu último clube, o Brasiliense chegou a ter uma boa fase na
Série C, mas depois acabou não conseguindo a vaga para as quartas de
final. O que houve?
RC: O ano do time foi muito
ruim. Cheguei lá para disputar o segundo turno. Era capitão da equipe e
fiz um ótimo campeonato, mesmo ninguém esperando. Sou muito grato ao
Luiz Estevão, que sempre gostou do meu futebol e pediu para que eu
voltasse. Mas existe uma pessoa lá dentro que não vai com a minha cara. O
Brasiliense só colheu o que ele plantou. Infelizmente, investiu em
jogadores que não eram da grandeza do clube e só no returno contratou
jogadores de qualidade. Eu fui um deles, que cheguei para tentar salvar,
consertar a besteira que fizeram. Mas sozinho a gente não consegue
fazer nada. Mesmo assim quase conseguimos a vaga depois de uma temporada
horrível, devido à filosofia de trabalho que implantaram no início do
ano.
CF: Algum companheiro para destacar?
RC: São
muitos nomes, muita gente mesmo, mas eu posso citar o Sorín e o Alex,
nos tempos de Cruzeiro. O Pintado no América/MG. No Botafogo, o Scheidt e
o Dodô. No Grêmio, o Alex Mineiro, que é meu amigo até hoje. Eu só tive
problema mesmo com dois técnicos. Eles serviram como aprendizado, me
ensinaram o que não fazer como treinador. E como eu tenho vontade de
ser, foi uma experiência.
Entrevista realizada por telefone, quarta feira, dia 28/11/2012
Publicada no blog oagonizante.blogspot.com.br 01/12/2012
Contato: fiusa.caio@gmail.com
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