segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Entrevista: Lucas Ramon

Zagueiro chegou em 2008 em Malta, após se
destacar pelo Oeste-SP/Foto: Arquivo Pessoal
Em uma ilha, no continente europeu, com quase 1 milhão de habitantes, vive um brasileiro tentando a sorte no futebol. Revelado pelo Luverdense-MT, em 2004, o zagueiro Lucas Ramon, de 28 anos, chegou a Malta em 2008 após de destacar no Oeste, no campeonato paulista da série A-3. Após passagens pelo Qormi FC e Valletta FC, clube da capital onde foi campeão nacional e eleito melhor zagueiro da competição, chegou ao Vittoriosa Stars. Abaixo você confere a entrevista exclusiva que Lucas Ramon deu ao blog do Caio Fiusa. Na conversa ele fala sobre o período de adaptação no país e avalia a oportunidade de defender uma equipe maltesa para os brasileiros.

Caio Fiusa: Como você foi parar em Malta? Um país tão pequeno e tão desconhecido dos brasileiros. Conhecia alguma coisa a respeito?

Lucas Ramon: Eu não sabia nada sobre Malta, nem sobre o país e nem sobre o futebol. Eu tinha acabado de jogar o Campeonato Paulista da Série A-3 e viajei para o Paraná para acertar com a ADAP/Galo Maringá. Quando cheguei para assinar e estava conversando com um diretor do clube, um empresário daqui de Malta ligou pedindo um zagueiro. Na hora esse diretor me perguntou se eu tinha interesse em jogar aqui. Eu aceitei e desde então jogo em Malta.

CF: E chegando aí, como foi a sua adaptação?

LR: Foi muito difícil até porque eu não sabia falar o idioma. Primeiramente vim para um período de teste, então não tinha certeza se ficaria. Ou seja, além de toda a adaptação eu tinha que provar meu valor. Dentro de campo, no começo foi complicado porque os gramados são todos artificiais. Fora, eu não sabia cozinhar e não gostava das comidas daqui. E ainda tinha o fuso horário que me fazia ficar acordado até de madrugada para falar com a família. Todo esse período de adaptação durou 6 meses.

CF: E depois de tanto tempo no país, como avalia o futebol local?

LR: Tecnicamente o futebol não é dos melhores. É de muita força e essa foi a maior dificuldade para mim. Mas fui superando isso com a minha característica de sair jogando, que não é comum aqui. Mas para isso eu tive que aprender a jogar um jogo mais tático. Essa é uma exigência do futebol europeu. A realidade aqui é bem diferente dos centros europeus, os clubes não são estruturados e não têm retorno do dinheiro que investem.

CF: Queria que você falasse sobre os torcedores. A população em Malta não chega a 1 milhão, mesmo assim os clubes têm torcidas?

LR: Eles são totalmente fanáticos, porém nenhum clube tem um grande número de torcedores, como no Brasil. Teve época aqui que não dava para ir ao mercado que os torcedores pediam para tirar foto e autógrafo.

CF: E o campeonato é equilibrado?

LR: Na verdade não é tão equilibrado, são sempre 4 equipes que disputam o título. Em 5 anos no país, sempre uma dessas foi a vencedora. Mas, como não estou em nenhuma dessas, espero que a história nessa temporada seja diferente.

Após ser bicampeão nacional, Lucas Ramon chegou ao
Vittoriosa Stars em janeiro de 2012/Foto: Arquivo Pessoal
CF: Quando decidiu que jogaria em Malta, não temeu ficar esquecido e perder oportunidades em equipes brasileiras?

LR: Quando vim para Malta estava desempregado e precisando de uma oportunidade. Eu acabei me iludindo porque sempre gostei de desafios e achava que estando em Malta, perto das grandes potências, e me destacando, eu poderia conseguir uma chance em uma grande equipe. Mas a realidade não é bem assim. Não é impossível, mas acredito que chegar a um clube grande da Europa atuando no Brasil seja mais fácil. Eu vim para cá com um objetivo, mas as coisas aconteceram de outra forma.

CF: A renda per capita em Malta é de cerca de 20 mil doláres. Isso vale também para o futebol? É bom, financeiramente falando, jogar em Malta?

LR: Hoje tenho uma vida estável com as minhas coisas. Aqui não se ganha tão bem para ficar milionário como outros jogadores em países do centro. Mas é de onde vem o sustento para a minha família e eu recebo em dia. Então, não posso ficar reclamando.

CF: Depois de tanto tempo no futebol maltês e já identificado com os torcedores, não pensou em se naturalizar, até mesmo por ter características diferentes das dos zagueiros malteses?

LR: Pensar eu pensei e continuo pensando até hoje. Infelizmente os malteses não têm uma mentalidade profissional no futebol. Existe politicagem por trás de tudo que impedem eles de quererem naturalizar. Apesar disso, já tiveram vários rumores sobre o interesse na minha naturalização. Porém nunca fizeram o convite. Eu espero que isso possa acontecer, pois seria uma grande passo na minha carreira e acredito que assim poderia ter uma visibilidade bem maior, tendo possibilidade de então chegar a um clube que ofereça condições melhores.

CF: O futebol ainda é amador?

LR: O futebol é semi profissional e dificilmente vai se tornar totalmente profissional, embora eu tenha notado algumas melhoras nesse tempo que estou aqui.Todos os estrangeiros que vêm para Malta são profissionais e vivem exclusivamente do futebol. A maioria dos malteses exercem outra função. E é dessa função que vem o sustento deles. Mas existem também aqueles jogadores malteses que atuam fora do país.

CF: Jogar em Malta é vantajoso para os brasileiros?

LR: Olha, depende muito da situação e da condição do atleta. Na minha opinião é melhor estar aqui do que desempregado. Depende muito da posição do jogador. Por exemplo, atacante sempre é mais prevalecido. Indiquei um amigo, o Camilo Sanvezzo, que não tinha nada na carreira como jogador, nunca tinha ganhado dinheiro com o futebol. Ele veio para cá, foi o artilheiro do campeonato e daqui foi para a Coreia do Sul. Depois foi para o Canadá, onde hoje é muito bem pago e é artilheiro da MLS a frente do Henry. Acredito que se o jogador vier vai ter a oportunidade de conhecer um outro país, outra cultura, adquirir experiência, aprender outro idioma. Mas, se ele tiver outra proposta financeiramente boa, não compensa vir para cá.

CF: O que aprendeu nesse tempo convivendo com um cultura totalmente diferente da brasileira?

LR: Aprendi uma coisa importante como o respeito às leis de um país. Aqui a criminalidade é zero, são casos isolados, de vez em quando acontece algo violento. Acredito que isso acontece raramente porque as pessoas sabem que vão pagar pelo que fazem. Não tem impunidade. Agora eu estranhei um pouco a culinária, como falei antes. Eles gostam de comer caramujos, mas são aqueles que costumamos dizer no Brasil que dá barriga d´água. Gostam de comer também carne de cavalo e coelho.

CF: Queria que você contasse alguma história que tenha te marcado nesses 5 anos.

LR: Bom, tem algumas histórias legais. Um dia estava com a minha esposa e dois amigos no carro e do nada começaram a fechar a rua. Descemos para ver o que estava acontecendo e descobrimos que era a polícia que estava fechando a rua porque o Papa iria passar bem ali do nosso lado com seu batmóvel (risos). Tivemos a oportunidade de ver o Papa de perto. Uma outra história que aconteceu comigo e essa sem dúvida foi a mais importante da minha carreira, foi quando eu fui nomeado o melhor zagueiro do campeonato nacional. Eu estava muito apreensivo, já que haviam dois outros zagueiros muito bons concorrendo. Quando chamaram meu nome foi uma emoção muito grande receber o troféu. Sensação indescritível.

CF: Além da família, do que sente mais falta do Brasil e o que costuma fazer no tempo livre?

LR: Além da família sinto falta dos amigos e das delícias do Brasil, como um bom churrasco, pastel de feiram, caldo de cana e várias outras. No meu tempo livre tento curtir minha esposa e meu filho, além de jogar video game, assistir filmes e passear.

Entrevista realizada em 4/09/2013, pela internet.
Críticas, dúvidas e sugestões: fiusa.caio@gmail.com

Um comentário:

  1. Valew Caio, ficou mto legal a entrevista, sucesso pra vc na sua carreira, abracos!!

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